terça-feira, 17 de julho de 2012

Ói o trem...



Ói o trem…

Subo a rampa da estação de Duque de Caxias, sonolento ainda. Um senhor se posta à minha frente; idoso, caminha lentamente, despreocupado e com dificuldade. Sua falta de pressa destoa do caminho por onde passa.

Vou de trem, compactado junto a outros ninguéns, porque estou com pressa, como quase todos ali. Pressa de chegar ao trabalho. Pressa de encontrar minhas queridas aporrinhações diárias. Pressa de me esquecer de mim.

O senhor, zagueiro inconsciente, carrega uma sacola velha como ele. Lembro que minha mochila está arrebentada. Posso comprar outra na estação de São Cristóvão, quando lá chegar.

Ligo a seta, vou ultrapassar. Transeuntes à direita zunem contra a direção que tomo. Outros tantos se acumulam atrás de mim. Espero uma brecha. Troco de marcha. Passo.

Não deu tempo de tomar o café da manhã antes de sair de casa. Lá em cima tem a barraca de sanduíche: R$ 1,30 o misto com café. Já foi menos custoso o combo de café fraco com pão barato, uma fatia fina de queijo e seu par presunto. Não é caro ainda, devo admitir. Estou na próxima rodada. 

O trem se aproxima. Seis horas e dois minutos. Ainda dá tempo, vou esperar o misto e o próximo trem.

Pego e pago. Vou para um canto da estação, onde minha costumeira mesa/ topo da meia parede apóia o frágil copo quente. Engulo depressa.

Apresento o Bilhete Único à maquina que debita o que quer e me diz o saldo que ficou. 

Me aperto com a mochila puída no pequeno espaço deixado entre a grade e a roleta. Tomo cuidado para não deixá-la agarrada, como em alguma outra vez, no ferro que continua rodando. Preciso emagrecer. 

Desço a escadaria em direção aos trilhos.

Não espero muito até o trem brotar lá ao longe. Os passageiros potenciais como eu deixam a dispersão e se postam onde geralmente as portas se abrem. O trem para um pouco mais à frente. Tento não perder minha vaga.

As portas se abrem e não há espaço. Há gente! Muita gente. O cara atrás de mim empurra e a reação em cadeia, desafiando leis físicas, me coloca lá dentro. Estou longe do ferro para me segurar. Não tenho medo de cair. Não consigo nem me virar. Sou mais alto que os que me cercam, o que garante algum ar para respirar. 

Se pegasse ônibus demoraria um infinito par de horas para chegar ao Metrô, que me deixaria a quadras do trabalho. O trem me deixa perto do ponto do 461 que leva a Ipanema e me larga em frente ao prédio estampado onde trabalho. 

Já já eu chego. 

quinta-feira, 27 de março de 2008

Vistam-se



Depois de um dia de trabalho extremamente exaustivo, fui à igreja. Era missa da quinta feira antes da Páscoa. Fui encontrar minha namorada.

Entrei, flexionei meu joelho e me benzi. Notei que algumas pessoas me olhavam de modo diferente do normal. Não sabia, até aquele momento, o que aquelas expressões queriam me dizer. Olhavam como se olha alguém com a braguilha aberta ou a camisa pelo avesso.

Olhei para minha braguilha. Olhei para minha camisa; não estava pelo avesso, mas bem que eles queriam que estivesse.

Um ponto de exclamação em forma de camisinha tomava meu peito; lia-se em letras garrafais um Vista-se, logo abaixo. Era isso!

Trabalho no Programa de DST/ AIDS da Secretaria de Saúde do município onde moro. Essa roupa funciona como um uniforme não obrigatório. Gosto dela. Sinto-me bem vestindo ela. Nem reparei o que estava usando, para falar a verdade.

Já que estava lá, continuei. Sentei ao lado de minha namorada, participei da missa, tudo como manda o figurino. Entrei na fila da comunhão, comunguei, fui novamente para o assento.

Um homem destranbelhadamente destacou-se da fila onde segundos antes eu estava. Como um polvo epiléptico, sacudindo o dedo, ora em minha direção ora em outra qualquer, visivelmente furioso, olhos esbugalhados, pupilas dilatadas, gritando em falsete:

- Você deveria ter vergonha de comungar com esta camisa!

Cheio de meu cinismo habitual, olhei para ele com um ar de Mona Lisa e segui meu caminho.

Pensei depois seriamente no que ele argumentou (tsc). Refleti sobre o ocorrido. Ri.

Que babaca!

Fiquei imaginando se eu fosse outra pessoa. A crise de fé que o boçal poderia ter provocado com aquela agressão (agressão sim!). Ou então, se eu resolvesse bater boca - como ele estava doido para fazer - para defender minhas convicções, provavelmente acabaria com a celebração de pelo menos uma dúzia de pessoas que estivesse à nossa volta.

Então, meus amigos, usem sim camisinha. Usem mesmo! Protejam a saúde de vocês e dos seus companheiros. Sejam responsáveis com a sexualidade. O HIV está se espalhando e dificultando o viver de muita gente. Levando ainda muitas vidas, apesar dos avanços nos tratamentos. Isso, fora as demais doenças que podem ser transmitidas sexualmente.

Usem camisinha, não oprimam sua afetividade e sexualidade (isso seria um desserviço à conscientização) e sejam felizes!

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Meninos, eu vi!

Ontem à noite vi algo que não deveria ter visto. Algo que ninguém deveria jamais ver. Havia crianças lá e elas também viram, dos colos de suas mães. E homens e mulheres, eles também viram.

Andando de madrugada, voltando da casa da namorada, ouvi pipocos. Imaginei serem disparos do cano de descarga de um motoqueiro que vinha. Não eram. Eram tiros. Mais à frente vi um vulto, um homem de cuecas, calças sendo jogadas a alguém. Temi assalto. Temi por mim. Corri.

Um carro veio em minha direção. Homens em um pick-up, montados na caçamba. Não era nada. Jovens, como eu, andando na noite. Também viram o que eu vi. Estavam assustados, como eu também estava.

Logo atrás vinha um carro da polícia. Não, nada perseguiam. Passeavam pacatamente sob a lua. Tão pertos de mim e do que meus olhos presenciaram, nada viram.

Desnorteado e com medo, segui até o ponto de ônibus mais próximo. Já dentro da condução, passei pelo local onde havia visto o homem de cuecas. Coisa alguma estava acontecendo por ali.

Uns duzentos metros adiante, em um beco, pessoas se aglomeravam, carros estavam parados. Homens, mulheres e crianças; todos em volta de um homem jogado ao chão, sem cuecas, sem nada, punhos e tornozelos amarrados com trapos ensangüentados. Tremia, estrebuchava sobre o chão. Sentia dor, sentia medo.

A idéia de que se tratava de um assalto me abandonou. Era uma execução, só poderia ser. Acho que nunca vou saber quem era aquele homem ou porque estava naquela situação. Tampouco vou conseguir esquecer o que presenciei.

Hoje passei pelo local, de ônibus. Os rastros de sangue estavam lá, secos, na exata disposição de minhas lembranças. Minha mente foi invadida pelos homens, mulheres e crianças, todos em volta do homem, olhando. Nada viram, aposto. Mas eu vi, meninos, eu vi!

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Primeiro Contato















Dizem que todo escritor moderno e descolado precisa ter um blog. De preferência um desses mais cool, onde todos os escritores famosos e legais têm os seus. Aqui estou, então, pensando sobre o que diabos vou escrever aqui.


Não importa. Pelo que vi em outros blogs, inicialmente todos têm a mesma inquietação que eu, mas terminam achando seu caminho blogueiro, sua identidade autoral. Espero que assim seja comigo.


Enfim...